Especialistasl avaliam que a mobilidade
urbana está diretamente relacionada à qualidade de vida, além de ser um
dos maiores causadores de estresse da vida das pessoas
Agência Brasil
Pedro Peduzzi
Repórter da Agência Brasil
Brasília – Os efeitos negativos de um transporte público caro e de má
qualidade não estão restritos à questão da mobilidade urbana.
Prejudicam também outras áreas vitais para a vida do cidadão, como
saúde, educação, finanças e cultura. Especialistas e integrantes do
Movimento Passe Livre (MPL) consultados pela Agência Brasil
avaliam que a mobilidade urbana está diretamente relacionada à
qualidade de vida, além de ser um dos maiores causadores de estresse da
vida das pessoas.
“É um trauma para todo mundo. Principalmente
para quem fica em pé, duas horas, crucificado, com alguém tentando
pegar bolsa, apalpar. Não é à toa que as pessoas estão preferindo usar
motocicletas, mesmo que isso represente risco a própria integridade
física por causa dos acidentes, e não é à toa que essas manifestações
conseguiram tantas adesões”, disse à Agência Brasil o
doutor em políticas de transporte pela Universidade Dortmund, na
Alemanha e professor do Departamento de Engenharia Civil e Ambiental da
Universidade de Brasília (UnB), Joaquim Aragão.
As
manifestações citadas pelo especialista foram iniciadas pelo MPL em São
Paulo. O movimento tem, como um de seus interlocutores, o professor de
história Lucas Monteiro. “Defendemos Tarifa Zero porque, além de ser a
única forma de as pessoas terem acesso à cidade, o transporte público
beneficia áreas vitais como saúde e educação. Por isso já imaginávamos
que nossa luta se espalharia pelo país, mas não que iria alcançar a
dimensão que alcançou”, disse à Agência Brasil.
De acordo com o representante do MPL, o incentivo ao uso de
transportes individuais causa também problemas como aumento da poluição e
do número de atropelamentos, o que resulta em mais gastos e problemas
para a saúde pública. Dados do Ministério da Saúde mostram que, em
2010, 42.844 pessoas morreram nas estradas e ruas do país. Desse total,
10.820 acidentes envolveram motos. No mesmo ano, o gasto total do
Sistema Único de Saúde (SUS) com acidentes de trânsito foi R$ 187
milhões. Só com internação de motociclistas foram gastos R$ 85,5
milhões.
Além disso, acrescenta Monteiro, diversos tratamentos
de saúde deixam de ser feitos porque os pacientes não têm condições de
pagar pelo deslocamento. E o problema relacionado à falta de condições
para custear os transportes também afeta o direto e a qualidade da
educação.
“Frequentei muitas escolas públicas. É comum alunos
faltarem aulas por não terem dinheiro para ir à escola. Além do mais,
direito à educação não está restrito a apenas ir à escola ou ao banco
escolar. Os estudantes precisam ter acesso à cultura, a visitar museus.
E, sem circular, não há como ter acesso a isso. A grande maioria não
vai ao centro da cidade, museus, centros culturais para complementar
sua formação”, disse Monteiro.
Segundo Aragão, dificuldades
para mobilidade urbana afetam diretamente o rendimento escolar de
jovens e crianças, que ficam cansados e com o sono sacrificado. “É um
fator a mais a prejudicar o rendimento, além da qualidade de
instalações do ensino público. Da mesma forma, afeta também a evasão
escolar, a formação de profissionais e a produtividade do país”, disse o
especialista.
“A mobilidade bloqueia inclusive a vida social do
cidadão de baixa renda, que fica sem acesso a entretenimento, cultura e
lazer. Esses são privilégios das pessoas motorizadas. Uma família de
quatro pessoas que queira se deslocar da periferia até um parque no
centro da cidade gastará R$24, caso a passagem unitária custe R$3. Para
quem recebe salário mínimo, isso é impossível”, disse.
Arquiteto, urbanista e especialista em transporte público, Jaime Lerner
diz que por trás das manifestações iniciadas pelo MPL está o
descrédito nas políticas públicas e a falta de respostas à sociedade,
sobre os diversos serviços públicos prestados a ela. “E tudo fica mais
fácil em todas as áreas quando se tem um bom transporte público”, disse o
ex-prefeito de Curitiba (PR).
Muitas das mobilidades foram
anunciadas sem sequer estudar a própria cidade, avalia Lerner. Segundo
ele, é importante entender a cidade como um sistema de estrutura de
vida, trabalho, movimento e mobilidade juntos. No fundo, acrescenta,
faltam decisões políticas, e, em geral, essas decisões são voltadas
para soluções mais caras.
“O Brasil é rápido em fazer coisa
errada e demorado em fazer a coisa certa”, disse. “Sustentabilidade é
equação entre o que você poupa e o que você desperdiça. Portanto, se
tiver de se deslocar por distâncias cada vez maiores, é óbvio que a
coisa não vai funcionar”.
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